A Ladeira da Memória de José Geraldo Vieira ou A Falta de Grandeza na Literatura Nacional Clássica
Ou O Desabafo de uma Leitora Frustrada com a Literatura Brasileira
Eu posso contar nos dedos a quantidade de livros da literatura brasileira que li. Também posso contar (e a lista será muito menor) de quantos dos livros lidos eu de fato gostei, me apaixonei e favoritei lá no Skoob. É vergonhoso, claro, que como leitora eu conheça tão pouco dos clássicos nacionais - problema este que estou tentando mudar.
Confesso, no entanto, que sempre preferi mais quando a questão é a língua pátria, da literatura portuguesa. A Cidade e as Serras do Eça de Queiróz, por exemplo, foi um dos livros que eu mais gostei de ter lido no Ensino Médio. E O Amor de Perdição do Camilo Castelo Branco? Um primor de prosa e de personagens, assim como o seu conterrâneo.
Em relação a nossa literatura, eu nunca tive essa admiração como tenho pelos escritores portugueses ou (pior ainda...) pelos escritores ingleses, no qual eu tenho favoritismo. Há sim autores que apenas digo que foram bons de conhecer, como o Graciliano Ramos, o Jorge Amado, o José de Alencar ou o Lima Barreto. Adoro o Machado de Assis pelo seu estilo único e incopiável de escrever. Mesmo a minha escritora brasileira favorita, a Lygia Fagundes Telles ou a minha poetisa favorita, a grande Cecília Meireles, apesar do meu grande respeito por elas, não despertou em mim este olhar amoroso que tenho pelos escritores estrangeiros, como o José Geraldo Vieira fez com o seu A Ladeira da Memória.

Há muito tempo que isso me incomoda e muito na literatura brasileira, e ver esses retratos sempre foi para mim repulsivo.
Pode soar arrogante (e até anti-cristão) de minha parte, mas eu sempre repeli inconscientemente esses personagens do cotidiano, quanto mais "perder tempo" lendo-os. É claro que desejo conhecer bem os tipos de pessoas que podemos encontrar nestas terras, sendo isso uma caridade, o que é um dos grandes serviços prestados pela literatura, mas muito me espanta que somente o José Geraldo Vieira tenha fugido desse lugar-comum da prosa nacional, e não teve escrúpulos de elevar seus personagens a um plano muito acima do que estamos acostumados a ver, incluindo na vida real.
Jorge e Renata fogem do eixo estabelecido da prosa brasileira, em especial após a Semana de 22, que buscava uma literatura "tipicamente nacional" e qualquer erudição à lá europeia não era tão bem vista. José Geraldo Vieira criou personagens riquíssimos de espírito, ou como eu gosto de chamar, personagens de grande nobreza, longe do animalesco e do mesquinho. Vocês não imaginam o alívio que senti enquanto lia A Ladeira da Memória! Tais personalidades são possíveis de existir em um país em ruína cultural? Não tenho resposta para esta pergunta, sendo sincera, mas ao menos ter esta referência já é um consolo para mim que eu serei eternamente grata ao autor.
É triste em certo aspecto que tenhamos grandes personagens, daqueles dignos de admiração, apenas na literatura estrangeira. Que escritor brasileiro criou, por exemplo, um Philip Pirrip, protagonista de Grandes Esperanças do Dickens? E olha que ele fica um pouquinho atrás em comparação com outros personagens de outros livros/autores. Essa falta de referencial de grandeza na literatura brasileira, se olharmos para outro ângulo, pode fazer mais mal do que bem aos seus leitores. Acredito que a literatura não deve apenas expressar a condição de uma época ou lugar, mas apresentar a esta mesma época e lugar possibilidades que até então não eram imagináveis, e os protagonistas de A Ladeira de Memória cumprem este papel.
Mas como resolver este problema? Quem sabe se ressuscitarmos a obra deste grande escritor e povoarmos nossa imaginação com suas histórias tão belas e cheias da grandeza humana, que eu sempre admirei na literatura inglesa, não torne mais fácil a jornada de alimentar a mente com bons referenciais e exemplos de vida. O triste e o irônico é que o autor e sua obra tenham sido esquecidos no momento em que mais precisamos deles.
1 comentários
Muito bom! Nesse momento estou lendo "O Cortiço", estou gostando, mas me decepciono quando aparece algum personagem justo e digno, mas que logo depois cai na mesquinharia. Não há um que eleve o ambiente. Gostei do "S. Bernardo" do Graciliano Ramos, nesse, ao menos, o personagem faz um longo exame de consciência e percebe suas fraquezas, mas não suporta carregar o peso dos erros e cai abatido. Preciso ler urgente "A ladeira da Memória", pena que está esquecido. Enquanto isso vou lendo um pouco dos russos.
ResponderExcluirOlá. Lembre-se da cordialidade e do respeito. Qualquer comentário desrespeitoso para com a autora ou com terceiros será excluído.
Obrigada.